Só a educação não consegue
mudar o mundo. Mas sem ela tampouco o mundo se transforma. (PAULO
FREIRE)
As escolas, além de grandes geradoras de
materiais recicláveis e, portanto, prioritárias para implantação da coleta
seletiva, têm um papel determinante na promoção da mudança cultural necessária
a essa implantação.
O lixo brasileiro, com grande
quantidade de materiais que poderiam ser reutilizados ou reciclados, representa
um comportamento cultural que negligencia o desperdício e demonstra descuido
com os recursos ambientais e mesmo falta de solidariedade com as pessoas que sobrevivem
das sobras no nosso país. Como responsável pela formação das futuras gerações, a
escola é o espaço privilegiado para introduzir novos valores e hábitos que
possam mudar o perfil de geração e de manejo de resíduos nas cidades
brasileiras. Além disso, as crianças e jovens, ao perceberem e incorporarem
esses valores, levam os novos hábitos para suas famílias, completando os
efeitos positivos do processo educativo.
Um problema em
relação ao trabalho nas escolas é que no Brasil, principalmente as escolas públicas,
já têm uma grande dificuldade para cumprir o programa tradicional de ensino, e o trabalho
de educadores já envolve muito investimento, e muitas vezes sacrifícios
pessoais.
Em decorrência disso, alguns
professores podem resistir à proposta de implantação da coleta seletiva, por
temerem mais trabalho e responsabilidades, dificultando ou mesmo impedindo a adesão
ao projeto em determinadas escolas.
Em geral, entretanto, o
projeto de coleta seletiva é atraente para as escolas, que o identificam com
temas atuais, como efetivamente são a reciclagem e a preservação ambiental. Por
esse motivo, é comum que as escolas se precipitem tentando implantar a coleta
seletiva sem o adequado planejamento que é importante para prevenir algumas
situações indesejáveis e que acontecem com certa frequência.
Fonte da imagem: cantinho da alê |
Não se deve estimular a separação de
recicláveis antes de saber o que fazer com eles!!! A expectativa de retorno
financeiro não deve ser o fator de motivação do projeto de coleta seletiva nas
escolas.
Há grande risco de haver
experiências mal-sucedidas, pela falta de planejamento adequado ou por gerarem
expectativas de resultados que não são facilmente alcançados. É comum, por
exemplo, esperar retorno financeiro com o acúmulo de materiais recicláveis na
própria escola, sem avaliação prévia das condições de seu armazenamento e
comercialização. Há relatos de casos em que escolas tiveram que pagar para
retirar recicláveis acumulados, por não terem feito um estudo de viabilidade da
sua comercialização.
Além disso, as escolas devem priorizar o
processo educativo e não o comercial em um projeto como esse. Além de
competirem com os catadores quando passam a comercializar recicláveis, os
estabelecimentos escolares não têm instalações apropriadas para a separação e
triagem de materiais.
Em outras situações, as
escolas implantam “lixeiras coloridas” para coleta dos recicláveis,
considerando que isso, por si só, é um processo educativo. Ao contrário, a
implantação de uma infra-estrutura de coleta sem um projeto que inclua a
destinação adequada dos recicláveis e também sem um trabalho de mobilização da
comunidade escolar, pode criar resistências nos alunos para participar de
outras experiências futuras mais bem planejadas. É comum ver escolas,
principalmente particulares, se orgulharem de espalhar coletores de recicláveis
sem nenhuma reflexão sobre a relação desses equipamentos com o processo
educativo.
É importante tecer essas
reflexões preliminares, antes de propor atividades para implantação da coleta
seletiva em escolas e universidades, exatamente pela importância que essas
instituições têm no processo educativo implícito num programa como esse.
Finalmente, deve-se destacar
que as universidades federais incluem-se entre os órgãos que devem implantar a
coleta seletiva em atendimento ao Decreto Federal nº 5.940/06, que institui a
separação dos materiais recicláveis descartados e sua destinação para
associações e cooperativas de catadores.
Assim, essas universidades
devem seguir o roteiro apresentado no capítulo anterior, que orienta a
implantação de coleta seletiva em empresas e instituições. Deve-se, contudo,
atentar para a importância de incorporar atividades educativas ligadas ao tema
nos currículos dos diferentes cursos, o que é detalhado a seguir, neste roteiro
de implantação da coleta seletiva em escolas e universidades, análogo ao
roteiro para empresas e instituições.
FORMAÇÃO
DE COMISSÃO COORDENADORA
Na implantação da coleta
seletiva em escolas e universidades públicas ou privadas, a primeira ação é
também a constituição de uma Comissão para planejar e coordenar a implantação
de todo o processo. É necessário haver a indicação de um coordenador, com o
respaldo da direção, que deve se comprometer com o programa de coleta seletiva
inserindo-o entre os objetivos da escola ou universidade.
Os participantes da comissão
deverão responsabilizar-se pelas seguintes etapas/atividades:
- Realização de Diagnóstico
Participativo, preferencialmente envolvendo alunos e professores, com
levantamento de informações sobre a situação da gestão dos resíduos na Unidade
– geração e destinação dos resíduos – e sobre as organizações de catadores
existentes no município;
- Planejamento e implantação
do projeto;
- Organização de atividades de
sensibilização e mobilização para adesão ao projeto e programação de atividades
educativas prioritariamente inseridas em projeto pedagógico que incorpore, em
todas as disciplinas, os temas afeitos à questão do lixo e à implantação da
coleta seletiva;
- Interlocução com as
cooperativas ou associações de catadores;
- Monitoramento, avaliação E
realimentação do projeto.
É importante que os membros da
Comissão se capacitem, por meio de revisão bibliográfica, pesquisas na
internet, contato com outras experiências. Deve-se buscar a maior quantidade possível
de informações sobre o tema, construindo-se um acervo para pesquisa e também
para balizar atividades na escola.
Uma experiência que se destaca
é o programa USP Recicla, através do qual se implantou a coleta seletiva em
vários campi da universidade no estado de São Paulo (www.inovacao.usp.br/ usp_recicla/index.asp.htm).
REALIZAÇÃO
DE DIAGNÓSTICO – ANTES DE IMPLANTAR, É IMPORTANTE “OLHAR EM VOLTA”...
Considerando a importância do
papel da educação na revisão de valores para o trato com o lixo e implantação
da coleta seletiva, é necessário que, em todas as atividades, o caráter
educativo seja priorizado em relação aos aspectos operacionais. Assim, a
primeira atividade do diagnóstico já deve apresentar cunho pedagógico. É muito
comum as pessoas não se darem conta dos aspectos relacionados à limpeza,
geração e manejo dos resíduos, até que sejam convocadas a participar das
soluções para os graves problemas ligados à gestão inadequada do lixo.
Nas escolas e universidades,
podem ser encontradas muitas situações indesejáveis relacionadas ao lixo e que
precisam ser identificadas antes de se iniciar o processo de implantação da coleta
seletiva. Problemas com a limpeza dos locais, com lixo jogado no chão pelos
próprios alunos, acondicionamento inadequado para a coleta, desperdício,
catação informal, venda de recicláveis por funcionários, etc., são fatos que
precisam ser identificados, preferencialmente com registro fotográfico, que
permita a sua divulgação em toda a comunidade escolar. É importante que todos
reconheçam a realidade em que se pretende intervir, para que percebam de forma concreta
a importância da participação de cada um.
A etapa de diagnóstico já pode
incluir trabalhos específicos ligados a diversas disciplinas. Vejam se estas
possibilidades:
- Os alunos podem levantar,
nos trabalhos de matemática, por exemplo, o volume de recursos gastos na compra
de materiais e na destinação dos resíduos pelo órgão.
- No diagnóstico também se
realiza o levantamento dos principais materiais de consumo potencialmente recicláveis
utilizados na unidade (papéis brancos e formulários diversos, jornais e revistas,
caixas em geral, envelopes, cartazes velhos, plástico – copos descartáveis e
cartuchos, lâmpadas, CD, disquetes e outros). A composição desses materiais,
com a identificação dos recursos naturais de que são extraídos, podem ser
objeto de estudo em disciplinas como ciências;
- O levantamento dos tipos de
resíduos e a estimativa de geração – recicláveis (escritório e copa: papel,
cartucho, alumínio, vidro, plástico, lâmpadas, CD, disquetes, etc.), orgânicos
e rejeitos (banheiro) também podem ser vinculados a diversas disciplinas, como
matemática (estimativa de quantidades de resíduo por tipo).
- Outras informações devem ser
levantadas no diagnóstico como o fluxo, horário e frequência do recolhimento,
volume estimado por tipo (recicláveis, rejeitos) e os responsáveis pela coleta interna;
como é feita a destinação – para onde os resíduos são enviados e como é feita a
coleta (coleta convencional da Prefeitura, catadores de rua, cooperativas,
compradores de materiais recicláveis, comercialização pela própria unidade,
doação a prestadores de serviços e outros); identificação das cooperativas ou
associações de catadores que possam se responsabilizar pela coleta dos
recicláveis; se já houver catador coletando, verificar a possibilidade de sua
manutenção no processo da coleta; se já houver destinação dos recicláveis a
outros beneficiários, fazer a transição de forma cuidadosa, para não gerar
conflitos com os catadores.
Ainda na etapa de diagnóstico,
devem ser feitos contatos com as cooperativas ou associações sobre o
interesse/viabilidade e capacidade de coletar os materiais selecionados na
Unidade.
Pode-se propor também que se
efetue, na própria Unidade, a caracterização dos resíduos, procedendo-se ao
armazenamento de todos os resíduos gerados — excetuando-se o lixo dos banheiros
e os orgânicos — por uma semana, para posterior separação, análise e pesagem.
O resultado da caracterização
deve apresentar os dados quantitativos e qualitativos sobre os resíduos, além
de orientações pertinentes à implantação e/ou melhoria da coleta seletiva.
Considera-se que esse
procedimento pode envolver diversas disciplinas, como matemática, para o estudo
dos aspectos quantitativos; química e biologia, na caracterização qualitativa; ciências
sociais (história, geografia), para levantar o histórico da cultura brasileira,
marcada por hábitos de imenso desperdício, que certamente deve ser explicitado
no processo de caracterização do lixo da Unidade.
Fonte do texto: crea-mg.org.br
Fonte da imagem: cantinho da alê
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