28 junho 2017

TRANSFORMAÇÃO DE REJEITOS DE MINÉRIO EM CIMENTO

Reciclagem – Transformação de rejeito de Minério em cimento


Pesquisas da Escola de Engenharia transformam rejeito de minério em cimento, areia e pigmentos

O Brasil conheceu, de forma assustadora, no deslizamento de barragem em Mariana, o potencial de destruição do acúmulo do rejeito de minério de ferro.
TRANSFORMAÇÃO DE REJEITOS DE MINÉRIO EM CIMENTO
TRANSFORMAÇÃO DE REJEITOS DE MINÉRIO EM CIMENTO





 Poucos sabem também que esse rejeito pode ser reciclado. Pesquisadores da Escola de Engenharia da UFMG detêm a tecnologia para transformar rejeitos e estéreis de minerações de ferro, bauxita, fosfato e calcário em produtos como cimento – para construção de blocos, vigas, passeios, estradas –, areia – que pode alimentar a indústria de vidros e de chips de computador – e pigmentos, para a produção de tintas, por exemplo.
Diversas pesquisas são realizadas no Laboratório de Geotecnologias e Geomateriais do Centro de Produção Sustentável da UFMG, em Pedro Leopoldo (MG), em conjunto com empresas brasileiras, universidades federais, instituições internacionais e com apoio da Fapemig e do BDMG. A unidade conta com planta-piloto de calcinação flash (queima controlada), automatizada, com capacidade de produção de 200 kg/hora. A calcinação flash (CF) é tecnologia de ponta que possibilita calcinar microparticulados, o que é impossível nos fornos convencionais. Essa propriedade da CF possibilita transformar alguns compostos mineralógicos das matérias-primas como rochas estéreis e rejeitos de tratamento em ligantes de alta resistência que geram, por exemplo, ecocimento.
“Da mesma forma que os antigos aproveitavam a propriedade pozolânica [de reagir com outras substâncias para gerar um ligante] das cinzas vulcânicas e da argila, é possível submeter estéreis de mina e lama de barragens à calcinação ultrarrápida para obter cimentos e outros derivados”, afirma o professor Evandro Moraes da Gama, do Departamento de Engenharia de Minas. Ele coordena o Laboratório de Geotecnologias e Geomateriais, ao lado do professor Abdias Magalhães Gomes, do Departamento de Engenharia de Materiais de Construção.
Evandro da Gama salienta que é possível aglomerar o rejeito em forma de pelotas – como se faz com o próprio minério –, em pilhas, com 100% de segurança, dispensando a utilização da água e eliminando a estocagem de rejeitos em barragens. “Essas pilhas seriam verdadeiros estoques de matéria-prima para os ecoprodutos”, ele diz.
O pesquisador explica que os solos do Hemisfério Sul – lateríticos e cauliníticos – são mais fáceis de serem encontrados. “Aqui o tratamento do solo gera produto final mais rico em propriedades pozolânicas. As rochas alteradas e intemperizadas são pulverulentas, e a granulometria natural é favorável à calcinação flash. Como as partículas são muito finas e próximas de sua forma cristalográfica, são transformadas após a calcinação em metasssubstâncias minerais, que criam superfícies específicas muito grandes. Dessa forma, podem ‘agarrar’ com mais facilidade outras partículas minerais. Isso gera o cimento.”

Estéril e Rejeito

O estéril de mina é formado por rochas que não contêm o minério de ferro, mas que precisam ser retiradas junto com o itabirito, por exemplo, para fazer a chamada cava de mina e possibilitar a atividade da mineração. “Esse estéril é reunido em depósitos controlados que não levam água e que representam importante passivo ambiental. Quando a água passa por esses depósitos, são gerados produtos indesejáveis com impacto sobre rios e florestas”, comenta Evandro da Gama.
O rejeito, por sua vez, é formado pela concentração do ferro no tratamento e tem natureza argilosa e arenosa. A utilização de água no tratamento forma a lama. “A lama e o rejeito arenoso são levados para barragens, que são obras geotécnicas de terra, feitas com técnicas da década de 1960. São obras frágeis e de risco”, diz o professor. Ele ressalta que, até por volta do ano 2000, as barragens tinham até 50 ou 60 metros de altura e hoje chegam a 200 metros, o que demonstra “falta de bom senso”.

Política nacional

Nos anos 1990, no Brasil e em outros países, segundo Evandro da Gama, começou a se perceber o aumento exponencial de rejeito e estéril de mina. As pesquisas na UFMG visando ao aproveitamento do rejeito de minério de ferro começaram há cerca de dez anos, com apoio de empresas e órgãos de fomento do governo.
O professor defende que pesquisas e produção sejam estimuladas por políticas nacionais de desenvolvimento, incluindo isenção de impostos e ações de valorização dos produtos ecológicos. “Países como a França, a China e o Canadá produzem derivados em larga escala. A França, por exemplo, já extinguiu a atividade mineradora”, destaca Evandro da Gama. “No Brasil, é preciso aproximar a indústria de transformação da indústria da mineração. Parte significativa do passivo ambiental pode ser transformado em matéria-prima para a construção da infraestrutura do país. ”
O rejeito arenoso pode ser reaproveitado, por exemplo, como brita para base e sub-base de estradas. Segundo Evandro da Gama, o volume da barragem que rompeu – cerca de 63 milhões de metros cúbicos – poderia ser transformado em base e sub-base para uma estrada com 3.500 quilômetros ou na construção de 120 vilas com 200 casas de 46 m2 de área total, ou seja, 120 cidades como Bento Rodrigues, o subdistrito arrasado pelo rompimento das barragens da Samarco.
Evandro da Gama e Abdias Gomes construíram uma casa de 46 m2 com rejeitos e estéreis de mineração de ferro. “A casa, que está em exposição no Laboratório de Pedro Leopoldo, tem custo 30% menor na comparação com materiais e metodologia de construção convencionais. E é extremamente confortável”, afirma Evandro da Gama. “Tem-se falado na reconstrução de Bento Rodrigues. Por que não lançar mão do próprio rejeito para erguer as casas e pavimentar as vias?”, questiona o professor.
(Itamar Rigueira Jr.)
– Via Site da UFMG
Fonte: https://www.eng.ufmg.br