13 abril 2016

A LICENÇA PARA OPERAR OUTRO ITEM PARA A SUSTENTABILIDADE

A LICENÇA PARA OPERAR 

Houve um tempo em que grandes indústrias se instalavam em um local e construíam toda a infraestrutura necessária para sua operação, incluindo vilas de funcionários com casas para as famílias, clubes, ruas e parques. Nessas comunidades o sentimento de identificação entre funcionários e empresa era muito grande, pois ela não só provia seus salários, mas oferecia benefícios de todo tipo para seu bem-estar.

Os tempos mudaram. As operações de setores com grande impacto socioambiental, como a mineração e a indústria de transformação, não têm mais uma relação de amparo com as comunidades onde atuam. Graças à mobilidade possibilitada pelo avanço das redes de transportes e comunicação, serviços, mercadorias e profissionais são contratados fora, e a riqueza circula muito mais do que antes.

A LICENÇA PARA OPERAR  OUTRO ITEM PARA A SUSTENTABILIDADE
A LICENÇA PARA OPERAR  OUTRO ITEM PARA A SUSTENTABILIDADE

Fonte da imagem primaria:liraambiental.com.br

Como fica a comunidade local nessa história?

Certamente os governos municipais têm um papel importante na distribuição dos recursos gerados pelas empresas, por meio do investimento inteligente dos impostos em bens públicos que vão tornar esse desenvolvimento sustentável, como escolas, rede de saúde, saneamento, etc. A política é decisiva para a estabilidade das comunidades hoje, muito mais do que antes; e política democrática se faz com laços de confiança entre pessoas e instituições. Isso vale para os agentes econômicos também.

Indústrias hoje precisam se esforçar para manter o respeito da comunidade em que estão estabelecidas. Já há muito que não são mais os provedores dos principais bens públicos e tampouco podem oferecer a enorme quantidade de empregos de meio século atrás, quando a tecnologia era incipiente e a mão-de-obra menos qualificada. Elas hoje compartilham o acesso a recursos escassos com outros atores econômicos locais, além de gerar impactos ambientais aos quais uma sociedade educada está cada vez mais sensível. Consequentemente, devem mostrar que as demandas que têm sobre a comunidade são legítimas.

Quando falamos em Licença Social para Operar (LSO), estamos nos referindo a um modo de pensar o impacto social de uma operação baseado no reforço dos laços de confiança entre empresa e comunidade. É uma visão de relacionamento que tem por base as relações de longo prazo, portanto institucionais. Difere da perspectiva de Responsabilidade Social Empresarial convencional ao colocar em primeiro plano a política. A LSO reconhece as relações de poder existentes entre os grupos sociais, procura entender seus projetos de longo prazo e não apenas seus interesses momentâneos, valorizando cidadania corporativa, transparência e compliance. É uma abordagem sobretudo realista quanto aos ganhos e perdas que uma indústria impõe à sociedade. Pode ser usada pela empresa para reduzir as perdas e negociar soluções de soma positiva com as partes interessadas.

A LSO propõe uma comunicação clara de direitos e responsabilidades entre empresa e stakeholders, com o compromisso mútuo de se entregar os resultados prometidos. Em uma palavra, confiança. No setor de mineração, é a abordagem escolhida pelas principais corporações, e vêm gerando estabilidade em comunidades vulneráveis à flutuação no preço de commodities. A manutenção da Licença Social para Operar significa que as partes que têm realmente um projeto de longo prazo para a localidade, aumentando suas chances de se impor sobre ações oportunistas, sejam políticas ou econômicas.

No Peru, a mineradora de ouro Minera Yanacocha, do grupo Newmont Mining,  investiu na criação de um fórum comunitário com verba e poder de decisão sobre a destinação de parte dos recursos gerados por sua operação, com participação de governo, sociedade e de uma associação de empresários. Uma decisão de concessão de poder, que poderia aumentar riscos políticos e econômicos para a empresa, graças ao voto de confiança depositado na comunidade se transformou num fator de estabilidade, com o planejamento para o desenvolvimento sendo feito de forma colaborativa.

No Brasil já há casos de sucesso de Licença Social para Operar, como o de uma mineradora que envolveu a comunidade num projeto de agroecologia vinculado a compras locais que transformou 50 famílias em empreendedores de agricultura orgânica. Essas famílias juntas passaram a ser atores com poder de influência sobre a economia da cidade e com investimento pessoal na sustentabilidade desse arranjo.

A Austrália e o Canadá, cujas economias dependem muito da mineração, são os protagonistas no emprego dessa abordagem. Dada a magnitude da indústria extrativa no Brasil, o potencial para disseminação da Licença Social para Operar é ainda pouco explorado, dependendo ainda para isso de maior divulgação e mais oportunidades de capacitação para os profissionais de sustentabilidade.
 *Por Fabrizio Rigout que é sociólogo e atua na área de avaliação de projetos sociais da Consultoria Plan Políticas Públicas.
  Fonte do texto:fiesp.com.br
 
ALÉM DA LICENÇA PARA OPERAR:
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Quais os benefícios obtidos?

Com apoio das metodologias, empresas de diferentes setores introduziram consultas sistemáticas a seus stakeholders. Porém – apesar das experiências cada vez mais aprofundadas –, existem ainda dúvidas em relação aos resultados obtidos.

Mas, observando a evolução do tema, será uma questão de tempo obter dados mais tangíveis para evidenciar esses resultados, pois essas experiências mostram que, hoje, já há uma série de vantagens para as organizações e seus públicos de interesse. Entre os principais benefícios do engajamento podemos citar:

 ALÉM DA LICENÇA PARA OPERAR
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- Capacidade de responder a desafios: por meio de mecanismos de diálogo e obtenção de retorno sobre seu desempenho social e ético, a empresa consegue identificar e gerenciar melhor os impactos e responder às necessidades e aspirações de suas partes interessadas. Isso pode resultar em redução de custos e maior eficiência das operações.

- Preparação de decisões estratégicas e operacionais: stakeholders são capazes de ver se o comportamento de uma empresa condiz com suas aspirações e, assim, posicioná-la melhor para articular suas opiniões. Uma organização, por sua vez, terá informações mais exatas nas quais embasar suas decisões.

- Construção dos relacionamentos: engajamento pode apoiar o aprofundamento das relações baseadas em valor ao longo da cadeia de fornecimento da empresa e em outros processos de parceria.
- Gerenciamento do risco: diálogos podem ser essenciais para uma estrutura de controle interno que permita à organização identificar, avaliar e gerenciar melhor os riscos que surgem de seus impactos e relacionamentos com as partes interessadas.

- Obtenção da licença social: em muitos casos, o engajamento com as partes interessadas é a melhor maneira de se obter e manter a licence to operate para negócios cujos impactos são relevantes para as comunidades locais. Assim, muitas empresas do setor de mineração ou de energia desenvolvem sistemas gerenciais para as relações com seus stakeholders locais.

Uma ferramenta estratégica
Embora nascido no âmbito da gestão de riscos, o engajamento com stakeholders é hoje visto como uma ferramenta estratégica da gestão da empresa, que tem o poder de reduzir riscos de futuros conflitos e concentrar seus esforços em tratar os impactos realmente considerados materiais.

O engajamento oferece oportunidades a todas as partes interessadas. Diálogo, como a forma mais explicita de engajamento, é a maneira pela qual elas podem identificar e articular suas preocupações e influenciar as decisões, para que impactos negativos (como emissões de poluentes, barulho, trânsito, discriminação, falta de consideração) sejam minimizados, maximizando-se benefícios potenciais (como emprego, planos de participação, investimento social). À medida que os assuntos são reconhecidos e debatidos, as partes interessadas podem se beneficiar das mudanças ou melhorias nas operações.

Reflexões importantes
No mundo corporativo, percebemos que o engajamento virou uma modalidade de ação na qual muitos executivos buscam melhorar o desempenho social da empresa ou obter consenso para temas polêmicos. Porém, mesmo com ferramentas muito bem elaboradas, muitas empresas praticam ou tentam praticar diálogos que ainda carecem de resultados e solidez. Isso se deve, sobretudo, a três fatores:

a) O primeiro ponto importante a se considerar é que o diálogo com partes interessadas externas trará o resultado desejado somente se a empresa começar com um bom exemplo e garantir um envolvimento do público interno. Isso pressupõe, naturalmente, que a organização cumpra com todos os seus compromissos e valores em relação ao seu público interno. Nesse ponto, em muitos casos, as empresas já encontram as primeiras dificuldades, pois será difícil manter um discurso aberto com públicos externos enquanto a própria casa não estiver em ordem.

b) O segundo déficit surge por falta da aplicação de um processo sólido. A empresa deve mapear com muito critério os seus públicos de interesse e criar um mecanismo que permita conhecer as suas expectativas. Normas como a AA1000 podem representar um grande apoio nesse momento, mas atualmente são aplicadas por poucas empresas.

c) O terceiro elemento é claramente a falta de análise a respeito do impacto efetivo do engajamento. A maioria das empresas ou organizações envolvidas com o diálogo se preocupa com a sua forma e divulgação, e pouco investem em medir e acompanhar o seu impacto no longo prazo, tanto no ambiente da empresa quanto para as partes interessadas envolvidas. Importante é, então, fazer o acompanhamento de desempenho e mensurar o impacto para todos, e não somente do ponto de vista da empresa realizadora.
Diálogo com stakeholders exige disciplina para ouvir com a disponibilidade de considerar outros pontos de vista. Isso não implica que a empresa ou organização precise atender a todas as expectativas das partes interessadas, mas é imprescindível responder de maneira adequada. O diálogo oferece oportunidades para todos: tanto a empresa como seus demais públicos de relacionamento, internos e externos. À medida que assuntos críticos para a responsabilidade da empresa são reconhecidos e debatidos, todas as partes se beneficiam das mudanças ou melhorias nas operações. As várias metodologias e processos de engajamento são apenas ferramentas que possibilitam o melhor funcionamento do diálogo e a construção de resultados e soluções concretas.

A adoção do diálogo como caminho, entretanto, independe de ferramentas e se relaciona, sobretudo, com os valores da empresa (ou órgão público) que decide – ou não – adotá-lo como um caminho para a solução dos desafios da sustentabilidade, de maneira mais inclusiva, legítima e participativa.

Beat Gruninger é sócio-fundador da BSD Consulting, membro do Standards Board da AccountAbility, representante autorizado da Social AccountAbility no Brasil e professor convidado do GVces sobre gestão das relações com partes interessadas.
 Fonte:.ideiasustentavel.com.br